quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Música independente

Integrante da banda Colettive comenta sobre sua relação
com o cenário independente. 

Nascido em Atibaia, o jornalista Willian Almeida, 25 anos, divide o seu tempo entre um jornal de Mogi das Cruzes e sua banda, na qual desempenha diversas funções, como guitarrista, vocal e compositor. Will comenta sobre a sua visão da cena independente, os coletivos de cultura da cidade e a filosofia do “Faça Você Mesmo”, que considera sensacional e duríssima ao mesmo tempo. Quer saber o motivo dessa pequena contradição? Ele participou da seção Com a Palavra da terceira edição impressa do zine Polaroid.

Polaroid – Como você conheceu a cena independente? 
Willian – Acho que conheci de diversas formas, mas todas elas passando pelo meu irmão Wagner. Como ele é cinco anos mais velho que eu, naturalmente eu bebia das fontes musicais dele. Eu também cresci em um bairro onde muitas pessoas tinham banda e curtiam som, de modo que a cena independente sempre esteve por perto de mim. Mas eu demorei a notar o que era tudo aquilo. Posso até dizer que antes nós tínhamos realmente uma “cena independente” e que hoje a coisa anda muito mais solitária. Já não há tantos lugares abertos ao independente e os que tentam criar essa característica sofrem problemas com a fiscalização e este tipo de coisa. Se há algo bom – e ruim na mesma proporção – na “cena”, é que ela não é muito bem vista. Apoio é uma utopia.
Talvez alguém pergunte: ora, não é independente? Para quê apoio? Bem. A cena independente é inteligente e ativa. A cena é cultural e auxiliá-la poderia ser perigoso para a engrenagem da indústria fonográfica. 

Polaroid - De onde veio a vontade de tocar e montar uma banda? 
Willian – Tive minha primeira banda aos 13 anos. O que significa ter crescido em meio a tantas me influenciou. Naquela época era tudo hard-core. O “Buchada de Porco” flertava com o grind. Não consigo identificar em que momento me veio a vontade de tocar, mas muito possivelmente se deu nas ruas onde amigos meus levavam o violão. No mês que completei 14 minha mãe me deu o meu violão – inseparável amigo – e aí foi o impulso que eu precisava. O Buchada durou por volta de um ano. E eu só tocava hard-core. Com o tempo passei a comprar revistas de cifras da Legião Urbana e com elas passava o tempo todo. Aprendi o – pouco – que sei sozinho. Jamais fiz uma aula. Há pouco mais de cinco anos montei a Colettive, minha banda atual, com mais três amigos. Tem uma proposta alternativa e autoral. Mas para não fugir muito à questão, acho que a vontade de tocar veio das bandas que ouvi e da minha necessidade de exprimir o que sentia.

Polaroid – O que você acha do Faça Você Mesmo? 
Willian – Eu divido em duas situações: sensacional e duríssimo. No meio musical, tudo é bem complicado. Não há apoio algum. A gente não pode tocar em canto nenhum e ninguém quer apostar em cinco, seis bandas que só tocam as próprias músicas. Fazer por si mesmo significa arranjar um local, ver toda a aparelhagem necessária, correr atrás de divulgação, conseguir instrumentos, compor, gravar, criar artes, disponibilizar, oferecer, apresentar... uma infinidade de coisas. Há muita gente bem intencionada. E existem muitas bandas – ótimas, por sinal – que jamais deram certo justamente pela dificuldade de ser independente. O correto seria ser independente por escolha própria, o que nem sempre é o caso.
 Eu disse sensacional porque eu não sei como explicar e nem acho que exista algo que pague o fato de você sair da sua casa, pegar o carro, lotá-lo de instrumento, gastar uma fortuna de combustível, chegar ao boteco – geralmente é um – descarregar tudo, tomar umas com os amigos, tocar, conhecer gente nova e entre elas alguém que chega para te cumprimentar pela banda ou por música específica. Isso é bem legal. Passa a sensação de que é possível.
A parte difícil é impressa no custo de uma gravação de boa qualidade, no valor dos instrumentos, na escassez de locais e, sobretudo, na utilização da cena, do faça você mesmo para benefício próprio. Está cheio de aproveitadores com ótimos contatos. Eles te colocam para abrir o show do Nando Reis, mas você precisa pagar alto por isso. Ou então, para tocar em casas mais badaladas, cobram que você venda 50 ingressos a R$ 20, como se fosse a tarefa mais fácil do mundo fazer seus 50 amigos e fãs da sua banda pagarem R$ 20 no ingresso, mais “x” no transporte e mais “y” com a diversão em si.

Polaroid – O que você acha que deveria ser feito para melhorar a cultura independente de Mogi? 
Willian – Mogi é uma cidade onde mesmo a cultura independente é dividida. Existem grupos e mais grupos, cada qual na sua panela, misturados ao mesmo tempo. Não há e nunca teve muito espaço para coisas novas que venham de pessoas que não sejam do “meio cultural-independente” da cidade. Se já é difícil haver espaço para uma banda do “meio”, uma banda de gente que necessariamente não é do “meio” recebe muito mais dificuldade. É como se a cultura independente da cidade fosse repartida e tivesse vanguarda. Parece estranho, mas isso existe. E o pior: pouca gente já notou isso. Eu notei, motivo pelo qual não sou tão próximo da cena mogiana. Acho que Mogi tem muito a aprender com o pessoal de outras cidades. Aqui falta bastante humildade, neste aspecto. E isso seria um dos passos para melhorar. Agora este é o menor dos problemas. Mogi é uma cidade elitista. Mogi é uma cidade onde a Prefeitura veta show do Racionais e do Planet Hemp – algumas vezes, rs; bares de menor potencial financeiro são impedidos de promoverem shows – há um alvará específico e caro para isso –; um grupo de Maracatu da cidade é obrigado a parar a apresentação que está fazendo, dentro do horário estipulado, nas festas de aniversário do próprio município, porque vai começar a pa$$agem de som no Milton Nascimento; e por aí vai. Falta respeito à cultura independente de Mogi. Ela não vende, né. Nem depende ou participa da Secretaria de Cultura. Um bom exemplo é Suzano, onde os grupos são mais bem tratados.

Polaroid – Qual é a importância dessa vertente? E o que pode ser agregado para quem recebe esse tipo de conteúdo? 
Willian - É o independente que com toda a dificuldade faz algo de diferente, que sai do marasmo. E agora eu tenho que bater palma aos coletivos da cidade. Ninguém faz fanzine pensando em dinheiro, não monta banda querendo dinheiro, não faz sessões de filmes e debates em casa pensando no dinheiro. Uma das melhores coisas que agrega a quem recebe ou participa dos frutos desta vertente é a noção de se fazer algo com um objetivo final de proporcionar coisas diferentes a si próprio e aos outros, de dividir alguma habilidade sua ou do outro, de tornar as coisas possíveis para que elas sejam conhecidas e não massificadas, colocadas goela a baixo da gente.
Vai muito além de apenas cena ou cultura independente. Ajuda a formar senso crítico, que é o que mais falta no País.

Polaroid – O que você acha dos eventos realizados pelos coletivos culturais de Mogi?
Willian – Muito bons. Participo pouco deles, é verdade, mas acho de uma validade sem tamanho. Não vou citar nomes porque não conheço todos e seria injusto com qualquer um que esteja nascendo por aí em algum bairro da periferia da cidade.
De alguma forma, estes eventos são criados na marra. O pessoal é guerreiro mesmo. Tira do próprio bolso para fazer acontecer. Esforça-se e vive para isso. Tudo com a ideia de movimentar a cidade, fugir do comum, oferecer coisas novas e receber coisas novas também. Seja com discussões, shows no meio da rua, apresentações de filmes ou webrádios, eles estão sempre ativos. Isso é muito bom.
De uma forma geral, acho que tudo que é feito sem ligação com o “ego” tem uma validade indiscutível. Talvez por isso, seja tão raro.

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